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Catálogo da exposição Luiz Aquila - Onze Pinturas - Lauro Cavalcanti


A pintura e o texto da pintura

Lauro Cavalcanti – Diretor do Paço Imperial – Rio de Janeiro

Os títulos dos trabalhos de Luiz Aquila são sempre iniciados pelas palavras "A Pintura ...." Tal fato indica duas pistas: primeiro que os seus trabalhos dialogam e se referem à história da Pintura como categoria ampla da arte. As pinturas de Aquila estão articuladas com a pintura americana do pós-guerra, sobretudo no que se refere aos color-fields e à analogia com o espaço real geográfico. A tela de Aquila dialoga com os processos pictóricos nos quais a pintura jamais é uniformizada por gestos automáticos que preenchem um desenho previamente estabelecido. Os gestos, conflitos e aproximações formais aparecem como registro do percurso para formar o quadro. A segunda pista aponta o pertencimento de cada tela ao conjunto da obra do próprio artista. Na retina e no espaço mental cada um de seus trabalhos se juntam, solicitando que o espectador forme uma grande tela.

Nesse sentido a sua produção seria uma pintura em permanente construção, correspondente visual do conceito da Never Ending Tour do poeta e músico Bob Dylan. Encarada dessa forma, cada tela solicita a atenção para o conjunto da obra e para as mudanças dentro de tal território.

Que contribuição traz, nesse sentido, o conjunto de pinturas produzidas em 1997 e 1998 que Luiz Aquila ora apresenta no Paço? A primeira delas refere-se à retomada da grande escala em um significativo conjunto de quadros. Nunca é demais anotarmos que o grande tamanho não é, apenas, uma questão de dimensões. Em outras palavras, uma tela grande não é a ampliação de uma tela pequena. A dimensão é um valor tão importante quanto a cor, matéria, estrutura e organização do plano. Junto com o retorno aos grandes formatos, o artista se impôs um prolongado isolamento e concentração exclusiva no ato de pintar. Resulta um trabalho denso no qual o tradicional embate entre a estrutura e o improviso ganham uma expressão, drama e alegria que invadem olhos e mentes. Por vezes algumas telas, como "A Pintura e a Chegada de Dom Manuel", adquirem um caráter de narrativa pictórica próximo a uma linguagem de cinema. Já outros, "quadros-assassinos", no dizer do próprio Aquila, exprimem os embates, armadilhas, manhas, falsas e reais inviabilidades travadas entre o pintor e o espaço da tela. Esses quadros, uma vez prontos, celebram o drama envolvido na sua realização e a vitória de sua existência.

As pinturas sobre madeira são uma novidade na trajetória de Aquila. Em "A Pintura Experimenta a Madeira", a delicadeza expressa a emoção e cuidado do experimento: o pincel deslizando, sem a resistência da trama da tela, espalha finas camadas, deixando por vezes a madeira respirar. Os recortes aparentes da madeira, a transparência dos veios sob a fina camada de tinta sugerem uma aproximação de transcendência que, de certa forma, aludem à lógica da construção de um vitral. Nos dois outros grandes formatos sobre madeira, prevalecem o preto, a concisão e a gravidade de um embate em território concentrado. Esses quadros demonstram quantas cores, tons, nuances e formas, até então imperceptíveis, podem habitar o negro. O vigor e qualidade do presente conjunto fará, com toda a certeza, que ele ocupe um significativo lugar na grande e boa pintura que Luiz Aquila vem construindo desde os anos setenta.

Texto para o catálogo da exposição Luiz Aquila - Onze Pinturas, Paço Imperial, Rio de Janeiro, setembro/outubro 1998; Galeria Nara Roesler, novembro/1998.


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